Posted: 19/02/2011 by Antonio Ozaí da Silva in reflexões do quotidiano
Certa feita, minha filha assistia a um filme na TV. Embora não suporto filmes dublados, por alguns instantes fiz-lhe companhia. Esqueci que ela detesta interrupções quando está diante do templo midiático e, imprudentemente, disse: “Este filme é um atentado à inteligência”. Continuei a argumentar. Ela interrompeu e, sem disfarçar a irritabilidade, sentenciou: “Pai, é apenas um filme!” Parei e pensei: “Ela tem razão. É só um filme!” Tempos depois, ao conversar com um amigo sobre cinema, mas sem lembrar este ocorrido, comentei enfaticamente: “É apenas um filme!”. E, novamente, irritei outro interlocutor. Foi preciso contemporizar para a conversa continuar.
Sou dos que adoram assistir a filmes. Em minha adolescência, em São Paulo (capital), costumava ir ao matinê, aos domingos, no cinema do bairro Sapopemba, Zona Leste. Assistia a filmes de bang-bang (Django, Trinity, etc.), western spaghetti (bang-bang a italiana), Tarzã e outros. Devo ter assistido a Dio come te amo várias vezes. Recordo que, no início da década de 1980, os amigos e companheiros do Parque São Lucas improvisavam uma tela em praça para passar filmes como “O homem que virou suco”. Era uma ação militante. Naqueles anos, aprendi a manusear o projetor 16 mm, com o qual passava filmes com conteúdo político e social em salas da Igreja e na subsede do Sindicato dos Metalúrgicos em Diadema. A chegada do videocassete facilitou e ofereceu mais opções de filmes. Houve uma fase que tinha programação constante de filmes. Era proposta uma lista de filmes e assistíamos o mais votado. Depois, já como professor no ensino fundamental e médio, em Diadema e no Guacuri (Zona Sul), utilizava o recurso fílmico. Essa prática foi mantida no ensino superior.
Portanto, posso ser criticado por muitas coisas, menos pela falta de gosto pela chamada Sétima Arte. Não obstante, não sou crítico de cinema e pouco sei sobre as questões teóricas e técnicas. Vejo os filmes como meios de conscientização política e recurso pedagógico. Devido à minha formação como sociólogo e cientista político, dificilmente os filmes serão mero entretenimento. Eles contribuem para a reflexão, enriquecem o conhecimento histórico, estimulam e subsidiam temas políticos, sociais e sociológicos.
Neste ano, assisti a vários filmes relacionados ao conteúdo e temas que trabalharei com meus alunos no semestre letivo. Os filmes não substituem os livros, textos e a exposição e análise teórica e conceitual, mas colaboram para a compreensão do contexto histórico, político e social vinculados aos autores e obras que estudaremos. São, portanto, recursos didático-pedagógicos importantes. A questão é saber usá-los.
Dessa forma, devo admitir que o filme não é apenas um filme. Ainda que a minha filha assim imagine, mesmo o filme mais ingênuo passa uma mensagem ideológica e é produto das relações sociais, políticas, econômicas e culturais. São os fatores que envolvem a produção do filme, e o contexto sócio-político, que fazem dele algo muito mais significativo do que parece ser.
Em 2010, assisti cerca de 125 filmes (incluindo documentários e musicais)*; neste ano, até o momento, foram 38.** Aprendi muito, mas também vivenciei muitas emoções – como diz aquele cantor aclamado rei! Foram imagens, palavras e histórias que me fizeram refletir, rir, e, admito, até mesmo chorar. Algumas vezes, ainda que momentaneamente, até criaram a ilusão de que eram reais e me fizeram esquecer que são criações artificiais; noutras, me irritaram a ponto de me perguntar por que insistia em assistir. Mas, sobretudo, fortaleceram em mim a noção do humano demasiado humano que somos. Decididamente, o filme não é apenas um filme!
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